domingo, novembro 30, 2008

Aprendendo a (si) (se) perdoar para ser (eu) o mesmo de outro modo...


Num dia em que mais me diverti, de que senti uma plena liberdade de ser e dançar, foi o mesmo dia em que minha malícia vacilou.

Talvez porque queria um pouco de atenção.
Talvez porque gosto de correr riscos por ser um romântico não confesso.
Talvez porque sou curioso demais.
Talvez porque tendo a achar a vida dos outros mais interessante que a minha.
Talvez porque, mesmo com pés no chão, vivo no mundo da lua.
Talvez porque o outro represente a possibilidade de novos entendimentos de mundo.
Talvez porque o desconhecido pareça mais intigante que os lugares comuns.
Talvez porque eu não tinha a noção de que os lugares excluem, sutilmente, quem se revela uma ameaça ao gueto.
Talvez porque não tenha me apaixonando tanto quando poderia ou tanto quanto deveria.

Muitos não gostam de talvezes. Ou os sins. Ou os nãos. Mas tenho aprendido que eles são melhores, nos colocam em situações que, por piores que também sejam, nos fazem refletir e, principalmente, ponderar e se, e a si, perdoar. Por nossas incompletudes. Ou como um amigo falou, que o melhor da vida é atentarmos para o fato de que estar-podendo-conquistar é uma grande privilégio. Pondendo é também sentido de dúvida, como o talvez, mas é igualmente gerúndio, continuidade da/da ação.

Passado mais de um mês desse dia em que senti a liberdade plena, sou outro. Como uma fênix que ressurge das cinzas para ser o eu mesmo (inquieto) de outro modo (sereno). Ou o contrário.

domingo, maio 25, 2008

Simplicidade de diamante

I.
Acordar cedo, antes das seis da manhã, antes mesmo de tomar um café ou coisa parecida, meio ainda em estado de sono, parece ser a atitude mais sensata em tempos de "desentabilização de expectativas" e "aceleração da rotina". De preferência, com algo pra ler no caminho, com algo pra ouvir nessa trilha. Talvez o usufruto mínimo burguês na busca de outras experiências, mais humanas e menos de consumo. Em cheque, os hábitos que se consolidam sem ao
menos nos darmos conta.

II.
Pois, se o mundo onde vivemos hoje, esse mundo de "homens livres" para fazer o que quiser, nos ilude com falsos caminhos, precisamos de estratégias de subversão para que possamos, por alguns momentos epifânicos, efêmeros e periódicos, perceber aquilo de que somos feitos, ficar de frente daquilo de que somos e estamos sendo feitos, a todo momento.

III.
Sinto-me um homem livre sim. Mas preso também. Nesse paradoxo que não é só meu, como aguçar o olhar para o que nos é singular, para reconhecer nossa força no que ganhamos e no que perdemos. Perdas e ganhos que nem todo mundo precisa saber, talvez ninguém.

IV.
Que as perdas nos fazem ver nossas fragilidades, o que realmente queremos para que estas tais perdas sejam possibilidades. Que os ganhos, na mesma lógica, são relativos e nos fazem ver também nossas potencialidades e para onde elas estão sendo canalizadas, que bem e bens trarão ao mundo e a mim.

V.
Tenho tentado refletir assim. É o processo que implica em reconhecer o que somos capazes, o que não somos capazes e o entre essas duas situações. Um entre que pode ser entendido como coisas que temos de fazer, mesmo com competências questionáveis, mesmo que falte fôlego, porto, cais, rocha.

VI.
É ser um IN-capaz, cuja força está em nós mesmos e, ver isso, pode nos ajudar a ser alguém melhor, bem-sucedido, evolutivamamente. Quero dizer, de permanecer, de continuar, entendendo restrições como possibilidades, e não como provações e limitações, mesmo que, na maioria das vezes, pareça isso, mesmo que tenhamos sido educados para ser assim, até por nós mesmos.

VII.
Que sempre faltará coisas, sempre haverá algo
"ausente que atormenta".

VIII.
E é isso, penso eu, que nos faz sermos humanos.
De ainda acreditarmos que uma vida boa e confortável
é uma vida simples:
simplicidade de diamante.

IX.
Palavras-chave: No hay.

quarta-feira, abril 30, 2008

Saberes que contam

Eis o exercício.

Como criar, então, outros hábitos se nem, ao menos, nos esforçamos para questionar as ações que regem nosso dia a dia?

Como valorizar a riqueza inesgotável do mundo e do presente, se somos educados e nos deixamos educar para desperdiçar a experiência que nos singulariza e não é percebida?

Como buscar alternativas para o coletivo, se ainda usamos as mesmas estratégias dos que nos oprimem?

Como conceber uma ação-manifesto que, ao invés de gritar e sair nas ruas, tenha um caráter de levante, de ações engenhosas e eficazes, e não de divãs?

Como ser mais coerente com a nossa realidade cultural, que é rica e diversa, e fortalecer o que já existe de forma precária e invisível?

Enfim, como transformar ausências em presenças, politicamente?


PS: Fragmento da critica escrita por mim para o Dia Internacional da Dança, 29.abril.2008, publicada no caderno Vida & Arte, do jornal O POVO (CE).

terça-feira, março 25, 2008

Sono da tarde

[{(já há algum tempo...)!}?]


Um dia,
Numa tarde sonei...

Sono com sonho,
Sono com pesadelo.

Sonhei com um homem
O homem da minha vida
Que existia,
Mas até agora
Só nesse sono-sonho
De um dia,
De uma tarde quando sonei...

Vi coisas nítidas, sim
Ele tinha um filho, feliz
E havia um homem, promiscuo
Outro que não era ele
Que, rindo,
Me perseguia.

Certa hora, fitei o olho
Nesse homem, não o outro
Mas o da minha vida
Que existia nesse sono da tarde
Nesse sonho taciturno
Nesse sono-sonho-quase-pesadelo

Olhei para ele e tive a certeza
Algumas dessas certezas epifânicas
Que ele era o homem da minha vida

Tenho de encontrar o dito
Para ele ser, de fato, da minha vida.
E não a lembranca perdida
De um sono da tarde

Pois um dia,
Numa tarde sonei,
E quando sonei...
Sono com sonho,
Sono com pesadelo,

Vi um homem
O homem da minha vida
Que existia,
E existe.

Que esse homem
Esse da minha vida
Não era eu,
Nem fui eu,
Nem sou eu...

Já há algum tempo.

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

De uma vez só. De uma vez, só

Que trilha fará alguém ou algo andarilhar mais que um passo a mais e mais que um passo a menos sem que falte fôlego p'ra prosseguir ou simplesmente seguir em frente sabendo que ir é vir e vir é ir sem cessar e sem saber cessar e sem saber acessar o que é imprevisto mas nem por isso improvável de acontecer e de permanecer como um desejo outro que é legítimo por ser seu e meu mas é ilegítimo por ser mais do outro que seu e meu o que não é necessariamente ruim pois dizem digo que o que é meu o que é seu tá guardado bem guardado bem bem guardado bem bem bem guardado mesmo que até parece que não existe mas existe pois se não existisse não estaria aqui a alimentar uma trilha que parece não ter fim que parece não ter sim que parece não ter dono que parece não ter sono que parece não ter preço e vai e continua pois o escondido do canto que se quer trilhar que se quer andarilhar é mais que saudade e é saudade mais que saudade boa pois é saudade apenas dessas destas daquelas outras que deixa a palavra bebada que nós faz beber da palavra e ficar bebadapalavra torta incerta prosa poesia ou sem lá o que que não se sabe o nome ou não se ousa dizer o nome e até se sabe e até se ousa pois se não tem ninguém p'ra perguntar pergunta-se assim mesmo a si mesmo e a resposta vem na forma de um girassol que diz algo que diz mal diz tudo que diz bem que diz e desdiz o que minha dança diz de muito e de mim e de ser e de ter talvez a ousadia de sonhar para além do esforço de sonhar para além do estorvo de sonhar para além do entorno que a gente leva por onde quer que queiramos por onde quer que estejamos por onde quer que pelejemos por onde quer que ninguém quer somente eu que só mente um pouco quando quer acreditar que o improvável é possível de realidades outras de realidades tantas de realidades mantras de realidades vastas de realidades castas e reais por serem humanas por serem ação por serem dança sem coreógrafo por serem canto sem maestro por serem trilha sem mapa por não serem tudo isso justamente porque é bússola que justamente ajusta a mente ...

Que a trilha que se fará é ad infinitum quando se tem sangue no olho quando se tem dança na carne quando se tem querença no coração ... Quando se tem, e temos.

domingo, fevereiro 24, 2008

Lema

Dançar diz. Dançar diz muito. Dançar diz muito de mim. Dançar diz muito do meu possível. Dançar diz muito do meu improvável. Dançar desdiz...

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Exaustão (se) dá (em) palavras

Porque preguiça
Falta de serotonina.
Tenho de correr,
Do tipo Robson Caetano
assim todo dia
Escrevo um pouco.

O jogo:

Tudo e nenhum
Todo e ninguém

Ser linguístico
Que dá palavras

Ou um exercício fitness
De desígnios
Que (se) dá (em) palavras

É algo mais ou menos p'ra mais
Ou p'ra menos.

A exaustão:

Pois é preciso sofrer muito p'ra escrever bem. É preciso precisar sofrer muito e bem p'ra escrever muito e bem. É preciso sofrer muito p'ra meu bem escrever. É preciso escrever muito pra sofrer bem. É preciso precisar escrever muito p'ra escrever bem, e sofrer. É preciso escrever muito pra sofrer bem. É preciso escrever bem, muito p'ra sofrer. É preciso escrever muito p'ra escrever bem e sofrer muito pra sofrer bem. É preciso escrever e precisar sofrer muito pra escrever bem. Escrever é preciso, muito e/ou bem, com ou sem sofrer, talvez. Pois é preciso escrever e sofrer bem muito p'ra escrever muito e bem, muito bem, meu bem!

Porque cansaço
Falta de vitamina
Tenho de caminhar,
Do tipo Forest Gump
assim toda hora
Trilho um pouco.

Que é preciso
Sem feitios
Contar cantos
Viver contos
Muito e bem.

PS: Quem sai na chuva é p'ra (si) (se) deixar...

quinta-feira, janeiro 31, 2008

Grandes ações são anônimas

Se a grama do vizinho é mais verde e bonita, isso não é motivo para não enxergar beleza no entorno da minha. Mas se, de repente, essa grama verde e bonita corresse algum risco, importaria mais que a minha? Quer dizer, a grama do outro merece algo além de só uma quase inveja meio ultrajada de admiração duvidosa? Ou melhor, que tipo e grau de poder tenho, temos, sobre a vida dos outros, anonimamente? Se a oportunidade faz o ladrão, pode também fazer o caridoso (na falta de outra palavra). Mas tudo isso parece exercício de ficção, pois, de fato, não temos tanto poder sobre a vida dos outros. O que temos é a possibilidade de colocar ou tirar algo que resultará em aproximados e não nos exatos planejados. Já ouvi que o ápice do prazer da vingança está em arruinar a vida do outro-objeto sem este o saber, aí quando ele-este estiver na ruína, na lama, na merda, em qualquer pior-bem-pior, o então vingado chega e detalha todos os porquês, que nada foi tão por acaso quando pareceu, mas pura causalidade. Maquiavélico, né? Deve ter sido deste aqui, enfim. Agora penso que se a história fosse outra, d'outro jeito. No lugar da vingança, a bonança, a generosidade, mas que, ao final, nada fosse dito, nem revelado. Ações más tem consequências, sabemos, mas as boas são as maiores, cuja grandiosidade vem do anonimato. E, num dia qualquer, num dia pós tudo isso que uma ação boa e anonima fez, faz, o benfeitor se depara com uma dedicatória para "um homem bom". Passa no caixa, compra o livro. O vendedor pergunta p'ra quem. Anonimamente, ele responde: "é p'ra mim". E a vida (dos outros e a dele) continua. De outro modo, de uma maneira providencialmente humana, com honrarias que só eles dois podem e devem saber, e ninguém mais.

Que a graça é outra, também.

PS: A ficção tem o poder de lançar olhar novo para trilhas sofridas de cantos distantes. Pois ajuda a reelaborar atrocidades de outrora, bem mais que só amenizar ...

segunda-feira, janeiro 28, 2008

Imagem justa

Sempre arranjo um pretexto pra ter uma idéia. São muitas, diárias, horárias. São tantas, urgentes, virulentas.

Idéias é algo bom. Revigora a mente, desenvelhece o corpo. Remetem a sonhos, anseios, desejos, querenças, genialidades, pessoas.

Aprendi, há pouco tempo, - ou até soubesse, mas foi há pouco tempo que me dei conta - que os bons sonhos, anseios, desejos, que as boas querenças, genialidades, pessoas são as que sobrevivem, permanecem, continuam nesse mundo por demais.

O que tenho feito nesse um ano é tudo isso e mais um pouco, um pouco menos, menos um pouco, mais ou menos tudo isso. De uma pré-dança virou pretexto pra ser proto-pré-literária.

Aqui. Um canto de fazeres. Uma trilha de saberes. Enconderijo de saudades. Transversal, entrecortado, multifacetado, déficit, superávit, tangente, tingente, versado, prosado. Aqui, divã incidental.

Eis a imagem que lhe (me) parece justa pra o que (quem) dança nas (in)tempéries.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Poema torto de uma prosa incerta

Primeira tentativa:
Cantar o não vivido
é também uma forma de dançar
o improvável

Segunda tentativa:
Trilhar o não desejado
é também uma forma de cantar
o intocável

Terceira tentativa:
Dançar o não pensado
é também uma forma de trilhar
o impronunciável

Aspas, por favor
Sinto que essas palavras não são
minhas

Aspas, por obséquio
Não sinto essas palavras
minhas

Quarta tentativa:
Talvez.

terça-feira, janeiro 08, 2008

O filho do seu Quinquim

Ele tinha 65 anos.
E reviveu aos 60.
Mas morreu aos 25.
Filho do seu Joaquim-Quinquim.

Morreu sim. De tristeza, poderia dizer. Daquelas que abatem qualquer mente jovem. Porém, diferente das de hoje, um pouco igual, confesso, mas um pouco bem diferente, idem. Sua fantasia não dependia da programação da televisão. Não tanto, já que se percebeu jovem, exatamente no ano de 58. Queria ser músico, mas, de certo, nasceu boêmio. Tocador de violão e cavaquinho. Ouvia muito rádio. Aprendeu de ouvido. Tentou ensinar ao filho que ainda viria a nascer, bem lá depois, mas foi em vão. Cultivava um bigode, costeletas e desejos. Cabelos ondulados, voz grave. Noivou cedo, mas casou só bem na frente, com outra. Via-se no espelho sempre que podia. Sensibilidade camuflada. Homem pra dedéu, dizia.

Era o mais velho dos irmãos. Oráculo. Logo novo, já aprendera a ganhar dinheiro. Fez pequena fortuna. Mas casamento, nem pensar. Por enquanto não. Era do tipo ainda-não-chegou-a-hora, mesmo já noivo, como falei. Ajudava a todos, homem de bom coração. Só não ajudou muito a si mesmo. Talvez, por isso, era mascate, do tipo moderno, não pós. Manaus, Teresina, Fortaleza, Aracajú, Feira de Santana, Salvador, São Paulo. Tipo Seu Quequé, pouco provável. Só suspeitas. Acreditava que iria enriquecer pelo comércio, lidando com gente. Gostava.

E muito, de lidar com gente. E lidou sim. Mas não juntou tanto, só o suficiente para uma juventude com ares lúdicos de prosperidade. Nunca matou ninguém, a não ser de raiva. Era teimoso demais. Porém, sabia de quem já havia matado gente. Um caso somente. Foi algo não premeditado, mas que lhe tirou algumas noites de sono. Pois acreditava no mundo melhor. Tanto acreditava que pretendia ter filhos. Eles vieram, bem depois: três. Um deles, sua cópia e quem o levaria na frente, de mãos dadas. O outro era o do cavaquinho, o que não quis aprender. Dois mais uma, eis a princesinha. Era como ele a chamava, ela que lhe daria dois netos, lá bem depois, um casal com diferença de três anos. Mas só conhecera o meninozinho, neto primogênito. A outra, só a vontade, só a lembrança.

Recém esposo, vendia de porta em porta, mas depois arranjou um ajudante. De bicicleta, fazia as cobranças. E ele, o filho do Joaquim, só pra lembrar, ficava em casa calculando os prejuízos. Dinheiro dá essa sensação de poder, o dos cálculos. Não à toa, a meninada de três – a princesinha, o que não aprendeu a tocar cavaquinho e o que era a cópia dele – adorava brincar de banco no quarto do quintal. Homem pra algumas sortes, também jogava e trabalhava no jogo do bicho para manter essa sede de lidar-com-gente. Ganhou pouco dinheiro, mas o que ganhou mesmo foi uma loteria para administrar. Uniu o útil ($) ao agradável (#). Era no nome da esposa, professora das boas, dessas pra vida toda. Mas quem mandava mesmo era ele. Pelo menos ela o fazia acreditar nisso.

Mandava, tinha boas intenções. Mas fez muita merda. O filho do meio, o mais sonhador, foi o que mais sofreu. E o que mais aprendeu. Era o oposto dele, um suplício pra um homem que se via no espelho sempre que possível. Depois viria a admirar esse filho do meio, o oposto. Quase tarde demais, pois a vida tratou de colocá-los juntos oito meses antes. Por isso, gostava de ir à igreja pra agradecer. Por tudo e por nada. Habituou-se. Sempre no domingo, às sete da noite. Todos arrumados, ele principalmente. Antes, quase ao meio-dia, levava a família para comer churrasco de carne e queijo coalho na brasa. Sentia-se feliz, o provedor. Ouvia música religiosa, dessas que apazigua o coração, aquieta a mente. Ou seria o contrário? Não era carinhoso. Ops, era sim, só ao jeito dele. Tapinha nas costas, passava a mão nos cabelos dos filhotes, assanhando-os, e um beijo na testa da matriarca.

Ele a respeitava, mas quem gritava alto era ele. O homem da casa. Um cão que só ladrava. Lição de moral mesmo era assunto de mãe. Mas batia sim, menos na menina. Corretivo era pros meninos, assunto dele. No que era seu oposto, surra das boas. No caçula, mão leve e bajulação madalena-arrependida pelo que fazia com o do meio. Queria filhos varões, mas mudou de idéia quando perdeu os dois. Um na vida, outro na morte. Já se preparara pra isso, de certa forma. Tanto que gostava de guardar recortes de jornal. Coisas boas e ruins da vida, naturalizadas nesse hábito secreto. Ilusão de capturar a realidade que sempre escapava das suas mãos. Não a entendia, mas, pra isso, a punha na ordem que queria. Diagramava a realidade. Fazia efeito. Ficava bem humorado.

Pois quando se casou, já passava dos quarenta. O filho do seu Joaquim-Quinquim.


PS: Conto também é canto, também é trilha

quarta-feira, janeiro 02, 2008

A incerteza de cada novo dia

A trilha do ano novo findou em vermelho.
Iniciou-se azul, Farol de expectativas boas.
Há algum sentido nisso, certa previsão, certa provisão.

Permiti-me ser ritualistico: rosa na mão, pensamento fundo e foco no pedido, o ato de jogá-la como oferenda ao mar. Pés molhados a contra gosto, mas sem estresse. Botou o pé em areia é pra se molhar. Paráfrase. Abraços menos figurativos, abraços de verdade é o que foram. Parecido com a virada de 6 pra 7, também na praia, com amigos em volta, desconhecidos no entorno. Outra orla, sentimentos semelhantes. Mas alguma coisa foi diferente, sinto, sei. Pareceu diferente. Um diferente igual.

Vejamos.
Esse ano passei a virada mais feliz com a minha maturidade. Uma inquietude serena, uma serenidade inquieta. Até filosofei com uma baiana a cerca dos abarás e acarajés da minha vida em Salvador. Disse ela, os abarás pequenos são os melhores. Acreditei e comprovei, mas logo retornei ao meu momento ano novo. Isso, maturidade de ver que as coisas estão melhores, justamente por elas estarem sendo vividas, e não só planejadas como outrora. Claro, há pendências, sempre haverá alguma. Não é o simples passar de um ano pro outro, em um dia pro outro que as coisas mudam.

Pois, como disse, todo dia é dia de ano novo. Se não disse, digo agora.

Então fui ao encontro do amado in process, in progress. Trânsito. Boina xadrez. Tênis verde-amarelo. Camisa branca. Cinto azul com vermelho. Expectativa boa, have a good time together. E a maldita frase, ouvida na recepção - "estamos entre amigos" - que, mal-compreendida, não me livrou de um incômodo: a canalhice de alguém que se estava quase gostando, de um quase namoro. A canalhice me fez ver isso, paradoxalmente, pois ao ver, constatar, rejeite-a, -o. De encontro a.

Paradoxal mesmo. Aí, o que fazer...

Batida no ombro, um adeus improvisado com o dedo polegar, uma cerveja de saideira (pra manter a pose) e olhos vermelhos na parada de ônibus. Uma hora pra chegar em casa: caminho errado, mas consertado por um citytour-divã-azul-das-6-da-matina.

Um amigo meu disse que fui trouxa. Ele já é um descrente. Antes do fato, uma amiga disse pr'eu investir. Ela, uma romântica realista. O que sei - eu, algo entre os dois - é entrei o ano na real, quer dizer, vivendo, colocando-me à prova. Fui, voltei, vim. Fiz escolhas. Ação tem consequências. Mar, promessas, sorrisos, amigos, lágrimas.

E o dia raiou pra me dizer tudo isso de outra forma. Sem máscaras, sem fantasias. Queira ou não queira, a incerteza acaba sendo a melhor parte da história de cada novo dia.